Admito que sou pueril o suficiente para enxergar em certas obras de arte somente a minha imagem refletida. Dito isso, esse filme é muito mais bem sucedido quando ele parte da ambivalência no sentido forte, mas meio broxante quando ele se torna sobre um garoto idiota objetificando uma garota. E aqui eu uso "objetificaçao" mais no sentido de "desumanização", não tanto "ver como um pedaço de carne", está mais para "ver como uma boneca de cera".

"O que será que a transferência dela realmente significa?"

eu envio minha mensagem ao filme e recebo ela de maneira invertida. Em certo momento eu disse coisas horríveis sobre a garota que eu estava apaixonado. Eu estava prestes a passar os próximos 3 anos pedindo desculpas, dando e demandando razões. Mas, naquele instante no tempo, havia apenas o prazer em difamar. Homoeroticismo masculino como refúgio da misoginia. Soluções comuns para caras medíocres sexualmente frustrados. Eu vejo o protagonista de Ocean Waves dessa forma. Ele não consegue enxergar a pessoa que tá bem na frente dele.

E claro, não vou contar mentiras aqui, não é por isso que o filme ressoou em mim, a questão não é da ordem da identificação. Eu não estou representada na tela. Mas eu queria que as coisas ainda fossem tão simples. Que eu pudesse botar tudo na conta da masculinidade, da adolescência, da relação com meu pai. Taku está vendo uma garota chorar na sua frente pela primeira vez. Meu terceiro ano foi muito tempo atrás, e eu supostamente me impliquei em uma ética do cuidado desde então. E acho que nem isso serve de explicação. Eu não infantilizei ninguém, minha fantasia não é sobre proteger garotas frágeis e indefesas. O inverso, na verdade: a lógica do meu fantasma é a de sempre me produzir como Garota Frágil e Indefesa. De alguma forma, acho isso muito mais perigoso.

"Boa noite. Como você está aproveitando as suas férias?"

Obcecada por falar de mim mesma, volto a escrever, na tentativa de me purgar dessa contradição que me faz cheirar a ressentimento. Mas não pode haver transformação sem contradição. Não sou sincera o suficiente para deixar minha carne queimar. Para acolher os sentimentos que me levaram ao mesmo ponto de sempre. Ocean Waves é sobre isso, eu acho, sobre uma covardia fundamental. Eu consigo sentir onde a ferida está, sei como eu deixei que nos tornássemos Um. Eu ainda vou fingir que essa é uma história de romance como qualquer outra.